Como portuguesa que sou fiz questão da última vez que saí de Portugal de beber vinho durante a viagem de avião para me tentar esquecer que estava a deixar o meu país...bebi tinto maduro, para ter uma ideia saudosista do meu alentejo e ribatejo lá longe... Este simples acto, o de beber vinho, não só me fez sentir bem e mal como foi em simultâneo um dos muitos milhares de retratos de portugueses deprimidos: ora porque deixam o país, ora porque ficam em território nacional, ora porque querem emigrar e não sabem como fazê-lo...outros ainda vi a resignarem-se simplesmente à sua sorte e em modo de velho do restelo a tomar comprimidos com aguardente para tentar esquecer a idade e a troika. Admiro os portugueses que conseguem esquecer a crise com um simples jogo de futebol ou com a telenovela da Santinha da luz. Admiro porque não sou capaz. Não há palavra mais triste e ignóbil do que o "trespasse" do antigo atelier da minha costureira, ou as horas mortas na fila do banco no dia de levantar a reforma, onde todos os analfabetos aproveitam para levantar as misérias do balcão uma vez que não sabem usar as caixas multibanco. Não há horror maior do que um belo dia cheio de sol onde se vê pessoas a pedir no aeroporto cigarros aos estrangeiros e ver os "chicos fininhos" com um inglês mal arranhado a perguntar "cigar, cigar for me no?" Durante um momento enquanto ouvia o inglês mal coloquial do" chico fininho", pensei que pelo menos os vagabundos que vivem na cidade do Porto e que apanham o tabaco do lixo dos outros são mais nobres do que aquele que estava ali a pedir ao estrangeiro sujeito ao ar trocista do turista que fingia não entender. Tive ainda uma vontade quase incontrolável de queimar a revista de bordo onde se podia ler: Don´t buy a house buy the neighbourhood ( não compre uma casa, compre a vizinhança) e ao fundo uma paisagem de uma dessas aldeias abandonadas do sul de Portugal.
Mas a maior de todas as crises, pior do que a monetária, do que a trocista é a crise de espírito e essa crise nunca vai chegar aos portugueses: a avaliar pela quantidade de piadas e trocadilhos da televisão e da imprensa nacional. O povo pode até ser ignorante, ser pobre, mas é livre e vai continuar a rir-se ainda que deprimido, com ou sem aguardente da troika, da Merkel, do Passos de Coelho, do Sócrates, do Alberto João Jardim e afins...porque ainda não se paga imposto por gargalhada ou por uma dose de má língua.
Escreves-te bem Paulinha,"ainda" não se paga imposto por gragalhada...
ResponderEliminarÉ uma expressão que também uso muitas vezes, porque se pagasse,aí é que eu entraria mesmo em crise...Se não outra, crise existencial...