Hoje penso na azinheira onde está Saramago e penso que um dia quase o conheci. Desde que morreu sinto a vida dessa azinheira e penso nela, penso que o vento que eu respiro pode chegar a essa azinheira e tocar as folhas dessa árvore.
São estas agruras que para os outros podem parecer infundadas que me submergem num nacionalismo por vezes taciturno e exacerbado. Mas a minha dor pertence também aqueles que ainda não são vento, nem árvore, mas que me escapam num folhear de livros e de movimento espacial. Quando era estudante esquecia os assuntos escolares e mergulhava nos textos do António Lobo Antunes, e ouvia constantemente alguém dizer:
- Mas vais de deixar de ler o que esse gajo velho escreve ou quê?! Não me dás atenção e não vês que estou aqui!
Sempre pensei que seria assim por gostar de literatura e por gostar de ler. Mas esse era só um fator da natureza de uma outra realidade oculta. Viria a descobrir anos mais tarde durante uma apresentação do Siza Vieira em 2007 na cidade de Lovaina que o meu entusiasmo por ver o homem que concebeu o Pavilhão de Portugal raiava quase o histerismo.
Siza Vieira, no Stuk, Lovaina na Bélgica. |
As mãos de Siza Vieira, 2007. |
Tirei fotos dele, fiz muitas perguntas e tirei fotografias das mãos do Siza vieira, e ficava a olhar para as fotografias das mãos do Siza Vieira e recordava com satifação as expressões dos estudantes belgas quando ele num inglês deficitário mas compreensível explicava que lhe bastava olhar para um lugar e imaginar mentalmente o edificio, fazer esquemas e fazer desenhos...Os estudantes habituados a uma metadologia de rigor aritmética por vezes não conseguiam conceber ou aceitar essa liberdade mental criativa...e eu estava no auditório inchava de orgulho como um pavão invisível prestes a rebentar.
Outra vez e enquanto caminhava na praça Flagey em Bruxelas e enquanto observava os óculos enigmáticos da estátua em pedra do Fernando Pessoa li a frase : A minha pátria é a língua portuguesa. E fiquei a pensar naquilo, fiquei a pensar naquilo durante muito tempo. Porque para onde quer que eu vá eu falo comigo sempre em português, sonho em português, insulto em português e durante todo este tempo estive sempre em casa e estarei sempre. Filosofias e literaturas à parte, aceitei essa versão temporariamente e pensei que fosse mais um elemento da população que em vez de adorar o Cristiano Ronaldo e de comprar tshirts ou camisolas com a cara dele como fazem os outros emigrantes, eu faça exactamente a mesma coisa de outra forma: estou com a mente fixa no Saramago, no António Lobo Antunes, no Siza Vieira, compro os livros deles ou os livros que falam sobre eles...
Um dia acusaram-me de ser uma nacionalista fascista. E eu achei um absurdo. Mas depois disseram-me: - Um dia se me quiser vingar de ti, sei o que fazer...Queimo-te os livros do Saramago e do Pessoa.-E aquela frase foi como um lume corrosivo, e só essa ideia me fez arder de raiva..e um estranho desejo sanguinário subiu pelas veias laterais da minha cabeça até ao cérebro. Passada a fúria fui obrigada a aceitar que sou uma nacionalista ferrada e ponto final.
Pelo menos assumes aquilo que és, e de onde vens, ao contrário de muita gente, que faz de tudo para ignorar as suas raízes....
ResponderEliminarbjs
Quem ignora as próprias raízes pode fazê-lo por ignorância ou por não se identificar mais com certos padrões culturais mas todos temos o direito à escolha. Obrigado.
ResponderEliminarBem, se me ameaçassem que iam queimar os meus livros eu provavelmente também teria uma reacção pouco racional... acho muito bem que continues a pensar e a insultar em português. Faz parte do que és.
ResponderEliminarGostei muito deste post.
beijinho e boa sorte para o casting
Obrigado. Tentei já convencer alguns antigos colegas jornalistas a darem-me o contacto do Manoel de Oliveira mas ninguém responde ao apelo. Acho que por me conhecerem devem ter medo do que eu possa fazer com o contacto. Para todos quero que saibam que eu só quero conhecer o Manoel de Oliveira, por favor alguém me dê o contacto!!!
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